sexta-feira, 21 de março de 2025

Cinema não se faz sozinho

 


Essa expressão, frequentemente usada no meio artístico, ganha ainda mais força quando aplicada à animação e ao desenho animado. Isso se deve à complexidade da linguagem e, principalmente, ao volume de trabalho que uma produção desse tipo exige. No Brasil, um caso emblemático ilustra bem essa realidade: Sinfonia Amazônica, o primeiro longa-metragem de animação do país, lançado em 1953. A obra foi realizada quase inteiramente por Anélio Latini Filho, que, sozinho, produziu mais de 500 mil desenhos ao longo de cinco anos de trabalho. Apesar desse esforço monumental, Anélio não esteve totalmente só. Contou com o apoio de alguns amigos e, sobretudo, de seu irmão, Mario Latini, responsável pela direção de fotografia. Guardadas as devidas proporções, a animação Fadário, embora tenha um caráter autoral e grande parte do trabalho tenha sido realizada pelo próprio autor, também contou com uma equipe talentosa, ampliando e qualificando o resultado final. Reunimos artistas de diferentes estilos e tendências, cada um contribuindo à sua maneira para a realização do curta-metragem. A saber: Aluísio Cervelle, quadrinista e animador, atualmente trabalha na produção de jogos eletrônicos, principalmente na criação de cenários e personagens. Em Fadário, além de colorir, foi responsável pelos cenários e ambientações. Érica Yamagush, ex-aluna do curso de artes plásticas do Garatuja desde a infância, já havia experimentado a animação em 2002, com o curta-metragem O Lobisomem, usando Super 8 como suporte. Formada em publicidade, se destacou em Fadário pelo traço refinado, detalhado e sensível. O mesmo pode ser dito da jovem Ana Tessarolo, que domina com precisão tanto o desenho quanto a pintura. Availdo Praxedes, de Joanópolis, é desenhista e ilustrador e teve papel fundamental ao digitalizar e registrar parte das cenas, além de colorir desenhos que exigiam maior realismo. De Bragança Paulista, Marcelo Goulart, que é tatuador, grafiteiro e poeta, contribuiu copiando e pintando desenhos, além de oferecer sugestões valiosas para o roteiro. Sua esposa, Juliana Celiberti, que atualmente mantém uma pesquisa sobre tintas naturais, também participou do projeto, copiando, colorindo da dando sugestões. Minha irmã Mariza Zago demonstrou seu talento para colorir contribuindo significativamente para Fadário. Theodoro Moretta (Theo), aluno do curso de artes do Garatuja, auxiliou na digitalização de diversas cenas já concluídas. Na trilha sonora, meu filho, Vitor Zago, compôs quatro músicas que acompanham a narrativa, dando o tom ideal às ações da animação. O equilíbrio entre imagem e som resultou exatamente no que imaginávamos. Por fim, tivemos a colaboração de Marina Bueno, Thiego Torres e André Raimundo, que serviram como modelos para as cenas mais complexas. Assim, Fadário reforça a ideia de que, mesmo em projetos autorais, a força do coletivo é essencial para alcançar um resultado artístico significativo.






quinta-feira, 20 de março de 2025

Tirando da gaveta...


O ano de 2024 foi dedicado à animação Fadário. Sua história, que originalmente não tinha esse nome, foi concebida no início dos anos 1980, na mesma época em que fundei o Garatuja. A narrativa original, o storyboard e as primeiras cenas da animação foram desenhados naquela época, mas nunca consegui finalizá-la, apesar de várias tentativas ao longo dos anos. A oportunidade de concluir esse trabalho surgiu agora, quatro décadas depois, graças ao edital municipal Paulo Gustavo. Devido ao longo intervalo entre sua criação e finalização, a história passou por pequenas adaptações, sem, no entanto, perder sua essência. Fadário aborda o destino que rege tanto as coisas quanto as pessoas – e, muitas vezes, as pessoas em função das coisas. A trama acompanha a trajetória de uma pedra preciosa encontrada por um garimpeiro. Essa pedra é transformada num broche que passa a influenciar diversas gerações, moldando vidas, por vezes de maneira trágica. O título Fadário, segundo o dicionário, tem duas interpretações: “Destino imposto por um poder sobrenatural e do qual não se pode fugir; fado” ou “Vida trabalhosa e difícil; desgostos”. Ambas se aplicam à proposta do filme, que se debruça sobre um questionamento filosófico recorrente: até que ponto um indivíduo controla sua própria vida ou é influenciado por forças e eventos que escapam ao seu domínio? No contexto das crenças e filosofias, essa questão pode ser vista sob dois prismas. O primeiro é o chamado “Destino Predeterminado”, presente em diversas culturas e sistemas de crença, que consideram o destino de cada pessoa previamente traçado por forças divinas ou cósmicas, tornando todos os acontecimentos inevitáveis. A segunda interpretação enxerga o destino como resultado das escolhas individuais. Enquanto o determinismo sugere que todos os eventos são consequência de causas anteriores, o livre-arbítrio defende que cada pessoa possui autonomia para tomar decisões independentes. A animação Fadário convida à reflexão sobre essas hipóteses, explorando os limites entre destino e escolha.